A Dor e eu

Foto: Fotografia de Luxo

Há algumas semanas, ela decidiu me acompanhar. Surgiu no meio do expediente e não me deixou concentrar. Pedi que fosse embora, mas ela se recusou. Quando entrei no carro para voltar para casa, lá estava ela, no banco do passageiro. Fomos as duas em silêncio.

À noite, peguei uma taça de vinho e me sentei no sofá. Ela se sentou ao meu lado. Falei que sua presença me incomodava, me deixava triste. Então ela sugeriu que eu chorasse, porque não tinha pressa. Podia até escolher uma música triste, para facilitar o processo.

Coloquei “Fake plastic trees” do Radiohead, e para minha surpresa, chorei compulsivamente. As lágrimas presas por meses desceram quentes e grossas. Me deitei em seu colo e, enquanto ela acarinhava meus cabelos, perguntei quem era ela. “Eu sou a Dor. Estou aqui porque você se recusa a tomar uma decisão necessária. Enquanto você adiá-la, não vou embora”, disse.

Eu sabia do que ela estava falando. Metade de mim acreditava que era o melhor a ser feito, mas a outra resistia, ainda tinha esperança. Na manhã seguinte, acordei com a Dor me olhando fixamente. Respirei fundo e fiz o que deveria ser feito. Senti um vazio enorme. E durante vários dias (e noites, principalmente) ela ainda me acompanhou.

Viajei sem a Dor. Voltei e ela continuava sumida.

Semana passada, apareceu rapidamente. Disse que havia cumprido sua missão e que, em breve, mandaria um amigo me fazer companhia. Gelei ao pensar no que viria pela frente. “Fique tranquila, você vai gostar dele”, me assegurou.

Então hoje entrei no carro e lá estava ele. Me pediu que colocasse “Felicidade”, do Marcelo Jeneci, e perguntou como eu me sentia. Respondi que estava leve, alegre, e que ele me passava uma paz de espírito incrível. “Dançar na chuva quando a chuva vem”, cantarolamos juntos.

Perguntei quem era ele. “Sou o Crescimento. Vim para te mostrar como você está melhor depois da sua decisão e o quanto evoluiu”, respondeu. É verdade. Naquela hora, todas as visitas da Dor fizeram sentido. Abracei-o com carinho e agradeci. A Dor tinha razão, ele é um cara muito bacana.

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