O monstro

Reprodução de “O grito”, de Edvard Munch (Foto: Depositphotos)

*Agnes Melo

A primeira vez que tive sintomas de ansiedade eu ainda era criança. Tinha dores de cabeça, tremores nas pernas, nas mãos. Aos 15 anos minha mãe resolveu buscar ajuda médica: “Ela é muito nervosa, doutor”.

Após vários exames completamente normais, o neurologista deduziu que eu precisava era de um namorado. Passaram-se 38 anos e virei freguesa de crises de pânico. Obviamente não era falta de namorado.

A conclusão a que cheguei , confirmada por vários parceiros dessa batalha, é de que ansiosos não têm cura. O intervalo de tempo entre uma crise e outra é que determina o impacto na sua qualidade de vida.

Não sei quantas vezes fui parar no pronto-socorro desde os meus 20 e poucos anos achando que estava tendo um ataque cardíaco ou um AVC. Minha vida por um Diazepan na veia para tirar aquela sensação de morte iminente.

A cada fim de crise parecia que eu tinha corrido 30 km, tal o esgotamento físico e mental, pois é como se seu corpo reagisse a um perigo real. Do nada, todos os mecanismos de alerta do seu organismo são acionados: taquicardia, sudorese, sensação de desmaio.

Por causa disso, por muito tempo fiquei estigmatizada entre amigos e família. “Não sei por que você tem essas coisas. Sua vida é tão boa. Tem um bom marido, emprego, casa, filhos lindos. Você tem é que ir mais à igreja”, dizia minha mãe. “Isso é falta de transar”, diziam os infiéis.

Diante desse desconhecimento sobre as causas da doença, a minha opção foi me fechar e seguir meu caminho contando apenas comigo mesma. Essa é minha luta.

Há anos tomo remédios. Às vezes paro, as crises voltam, retomo. E assim tem sido. Aceito. Aprendi algumas técnicas de controle, pratiquei yoga por anos, atividade física quando possível. Mas, sobretudo, aprendi a identificar e me afastar dos gatilhos que podem me levar a ter recaídas.

Na terapia descobri que traumas de infância – como abuso sexual dentro de casa, relação difícil entre meus pais, pobreza, entre outros – afetaram-me profunda e irreversivelmente.

Apesar de tudo, sou uma pessoa naturalmente alegre, de riso fácil e largo, solidária. Neurotransmissores descontrolados não vão me dominar.

*Agnes Melo, jornalista, alma livre, 53 anos.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *