Acolha as mães
*Waleiska Fernandes
A viagem era de São Paulo pra Brasília.
Eu estava sentada mais ou menos na poltrona 15, de onde era possível ouvir o choro exaustivo de um bebê algumas cadeiras à frente. Ele chorou muito na subida, atenuou um pouco durante o voo e ficou completamente desesperado na descida.
Estava incomodando geral. Pessoas murmuravam. Alguns palpitavam. Ninguém ofereceu ajuda.
Por morar longe da minha família, sempre viajei muito com minhas filhas desde bebês. Minha primogênita teve a sorte de ter uma avó pediatra, que sempre me deu muitas dicas, como “dê o peito nas subidas e descidas que a sucção vai atenuar a pressão que ela vai sentir no ouvido”.
Chamei a aeromoça e pedi que ela avisasse isso àquela mãe, que provavelmente também deveria estar desesperada (quem é mãe sabe como a gente se sente com o filho chorando e com olhares cheios de julgamento).
A aeromoça disse que já havia dado essa orientação, mas que a criança não pegava o peito.
Aí, me lembrei de outra dica valiosa da minha ex-sogra “Quando a mãe está nervosa, a criança fica ainda mais. Então, o primeiro passo é tentar se acalmar”.
O avião pousou, a pressão no ouvido provavelmente sumiu, mas o nervosismo daquela família pairava no ar. Os comentários sobre também. Tudo piorou quando o piloto informou que o desembarque demoraria por algum problema no aeroporto.
Levantei e fui até eles. Era um bebê de aproximadamente três meses acompanhado de pai e mãe jovens e da avó. Perguntei se eu podia segurá-lo e tentar acalmá-lo.
- Não vai adiantar – disse a mãe em tom de choro.
- Posso tentar?
Ela me entregou o pacotinho com as mãos trêmulas, dizendo que já tinha tentado de tudo, como se precisasse se desculpar.
- Está tudo bem. Você não precisa se justificar de nada. Apenas se acalme. Bebês choram. É normal.
José era o nome dele. Eu o abracei contra o meu peito e o embalei levemente. O choro foi parando. A mãe desabou abraçada com a avó. O pai olhava pra mim com tom cético.
As pessoas comentavam coisas como “Era ela que não sabia como segurar o bebê”.
Fiz o esforço de não me aborrecer com aqueles comentários maldosos sobre a moça pra que o José não sentisse aquela energia. Eu só queria que o bebê se sentisse calmo para que a sua mãe também ficasse.
O piloto autorizou o desembarque e todos passavam olhando.
Fomos os últimos a sair. Levei José no colo até o saguão. Lá, a mãe já estava bem mais calma e até ria da situação.
Eu estava muito triste naquele dia. Estava no meio de uma crise depressiva e me questionando sobre tudo, inclusive, sobre a minha maternidade. José me acalmou.
Ser mãe é um troço muito difícil. Só quem é, sabe o quanto somos julgadas a todo instante.
Se algum dia vires uma em situação similar, faça o esforço de não julgar. Seu olhar de cobrança só piora as coisas.
Acredito mesmo que a maternidade é uma responsabilidade coletiva. Ser acolhedor com as mães é o que melhor podemos fazer pelas crianças.
*Waleiska Fernandes é jornalista, gateira, feminista, ativista de direitos humanos e que tenta ser uma mãe fora da maternidade padrão imposta pelos convencionalismos (nem sempre dá certo, mas segue mirando nisso).