Relato de um pai que começou a trabalhar em home office

Foto: Arquivo pessoal

*Maurício Junior

Eu confesso… em algum momento pensei no íntimo do meu ser, sem falar para ninguém: pensei que trabalhar em casa era privilégio, inclusive para a minha esposa. Afinal, quem fica em casa poderia administrar melhor o tempo. Não é?

Quem faz do lar o seu escritório pode cuidar das crianças, educar e ficar mais próximo e mais presente na criação do filhos. Para quem sai pela porta isso é lindo! Filosoficamente perfeito até. Ao menos era o que eu acreditava até ser “obrigado” a trabalhar em casa por causa do coronavírus. Eu saía pela porta todos os dias para “trabalhar fora”. E, com isso, da tranquilidade do meu escritório, sentia que estava “cumprindo meu papel” nessa relação.
 
E as “coisas da casa se resolviam”. Quando chegava, já tinha jantar pronto, a esposa estava linda e cheirosa, as crianças de banho tomado, as compras na dispensa, as contas pagas, sexo ótimo. Em quase seis anos de casado, nunca ouvi: hoje estou cansada, com dor de cabeça, vamos deixar para depois.

Meu Deus! Como ela consegue isso?

Hoje, olho para essa realidade paralela pela lupa do confinamento, parece até utópico. Veja bem. Não me considero um machista… sequer acredito que o homem “ajuda em casa” ao assumir seu legítimo papel de pai, marido e dono de casa. Eu nunca fugi desse papel, apenas acreditava que o que fazia era suficiente. Mas eu era a pessoa que saía pela porta.

Confesso que sequer percebia o machismo estrutural que permeava essa visão. As “coisas” nunca funcionaram por si. Tudo custava muito para minha esposa. Muita energia e inequívoca paciência. Agora eu estou trabalhando em casa. E não dá para ignorar que a casa precisa ser limpa, as crianças precisam ser cuidadas, a roupa precisa ser lavada, a comida, feita. Nada surge feito.

E eu estou cansado, exausto e até impaciente. Com que direito?

Acredito que essa crise vai transformar o mundo. Então, que a crise possa me transformar também. Não em um marido melhor, mas em uma pessoa melhor, que enxerga a realidade do meu lar e sabe valorizar a pessoa que faz isso tudo funcionar. @vivipimentel é uma heroína, com poderes humanos incríveis e me ensina todos os dias.

*Jornalista, pai de Clarice, Helena e Rodrigo. É vice-presidente da agência Santafé Ideias, com 26 anos de existência e especializada em gestão de imagem, crise e relacionamento com a mídia.

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