Cabelos grisalhos: a minha transição
Em 2019, a minha imagem no espelho e nas fotos começou a me incomodar. A princípio, eu não soube definir a origem do incômodo, pois aparentemente nada havia mudado. Um pouco mais de atenção e percebi que a cor do meu cabelo parecia gritar nas imagens.
As marcas do tempo no meu rosto não se encaixavam com o castanho escuro e suas nuances, refletidas nos cabelos. Somado a isso, o marido grisalho e o filho com mechas brancas salpicadas pela cabeça faziam a minha imagem parecer ainda mais estranha aos meus olhos.
Dessas reflexões, surgiu o desejo de experimentar os cabelos brancos.
Será? Incontáveis vezes me fiz essa pergunta, sem ser capaz de decidir. Assumir os cabelos brancos não é um padrão para as mulheres da minha família. Minha mãe, tias, irmãs, primas e eu sempre mantivemos os brancos escondidos sob tinturas impecáveis, de cores variadas, mas branco nunca.
Este é o padrão culturalmente imposto e aceito na nossa sociedade, que vê os brancos nas mulheres como desleixo ou velhice decadente. Rompê-lo poderá ser mais fácil para as novas gerações, mas não para a minha.
Ter essas informações não diminuía o meu incômodo pessoal. Iniciei, então, uma busca na internet por mulheres que assumiram os brancos e por conselhos profissionais. Conversei com amigas e familiares, ouvi muitas opiniões contra, algumas neutras e pouquíssimas a favor. Minha conclusão: a transição é um processo pessoal e solitário.
Siga a sua intuição e vontade. Assim, decidi e iniciei a transição para os grisalhos.
Em fevereiro deste ano, fiz mechas claras para diminuir o contraste com a raiz que surge cada vez mais grisalha, saudável e brilhante. A indefinição de cores e a momentânea falta de corte ainda me causam um certo desconforto, mas sigo firme no propósito de completar a transição e me perceber por inteiro nessa fase da vida.
O processo continua e a decisão de permanecer ou não grisalha virá ao final dele, sempre seguindo a minha intuição e vontade.
*Ana Rita Carvalho é mineira, aposentada, casada, mãe e avó. Reside em Brasília onde construiu sua carreira como assistente social no serviço público. É especialista em Psicogerontologia e autora da página @viva60mais no Instagram e Blog do mesmo nome.