Corpos excludentes
Para uso contínuo. Era o que estava escrito no meu rótulo. Descartável. Era o que estava nas instruções de uso dele.
Mas eu não li. Estava inebriada pela embalagem que via, linda por fora, e, inferi, tão bonita quanto por dentro.
Fui abrindo o pacote na primeira oportunidade.
No afã, provei algo que não era exatamente o que eu procurava. Aliás, eu não estava buscando por nada: fui seduzida. Conduzida. Levada.
Tenho um defeito grave, que, imaginei, estava escrito na minha testa em português claro: não sou dada a relações superficiais. Jamais serei mulher de uma noite apenas. Não sei nem ao menos dissociar sexo de sentimento. Se me quiser, terá de ser por inteiro. Um combo.
Tivemos um choque de expectativas. Ele querendo apenas duas horas quentes. Eu achando que teríamos uma conexão.
Sexo é apenas uma pequena parte de um encontro. Eu preciso, sempre, ir além da superfície.
Mas, dessa vez, mergulhei em águas rasas. Não tive espaço pra nadar. Nem pra conversar, nem pra ler pensamentos.
Achei que ele seria um livro de cabeceira.
Um romance. Foi um panfleto. Uma bula de remédio. De dose única, mas que deixa um gosto amargo na boca por um longo tempo. Porque acaba sem nunca ter sido.
*Laura Lisboa é o pseudônimo de quem só aceita escrever se estiver nos bastidores. “Em tempos de vigilância total, a maior liberdade é não ser vista.”