Quem canta seus medos espanta
Lembro com nítida clareza da primeira vez em que subi ao palco. Confesso, não foi uma experiência prazerosa. Não tenho a pretensão de fazer ninguém acreditar que foi um momento incrível da minha vida. Não foi catártico, terapêutico, libertador, nem coisa alguma. As sensações ainda estão frescas, logo à esquina da memória: minhas mãos tremiam tanto quanto a minha voz.
O olhar se punha vacilante, diante de uma dezena de outros pares de olhos.
O fato é que aquele era o encontro derradeiro com tudo o que, desde sempre, temi: a exposição. O realce, o relevo, a importância. Postar-se sob os holofotes, colocar-se na linha de frente – chame da forma como quiser, o verdadeiro medo era o olhar do outro.
De um jeito que talvez tenha sido desengonçado e até torpe, eu cantei. Sincero, apesar de tudo, porque carregava a versão mais vulnerável de mim mesma em frente àquele amontoado de gentes de olhar tão distinto – incluindo o meu.
A verdade é que a música nunca foi algo que pensei para mim. Não imaginava, não almejava, não procurava. Até que fez sentido. Fez sentido porque se mostrou, enfim, uma maneira de contar histórias. Porque era entrega e escape a uma racionalidade obsessiva a qual aprendi a me submeter em tão poucos anos de vida.
A cada vez que passei a subir no palco, dali em diante, foi como dar um pequeno passo além de meu esconderijo anterior – sem pretensão de retornar. As mãos já não tremiam tanto, nem os olhos vacilavam da mesma maneira. Confesso que, depois de algum tempo, arriscava até alguns passinhos de dança, aqui e ali.
O frio na barriga não me abandonou, no entanto. Toda vez em que agarrava o microfone novamente, uma espécie de turbilhão ainda tomava conta de mim. Uma emoção tão congelante quanto cheia de calor e ardor, dentro da brevidade que carrega consigo. E eu gosto de acreditar que senti-la quer dizer que estou viva. Que estou vivendo e sentindo e me entregando a um desafio contínuo. Dentro e fora dos palcos.
*@luizalaux é aspirante a escritora, em constante aprendizado sobre o mundo ao redor. Para isso, ela conta com uma ajudinha da arte e reúne histórias no @blogsobrenotas.