Desconstruí minha fantasia
Eu já tinha pronto um texto sobre o Carnaval
Com a foto aí de cima, fantasiada de jornal
Mas soaria e seria falso
Não sinto hoje a alegria registrada no meu rosto nesse dia, vinte anos atrás.
Sou jornalista desde que me entendo por adulta
e sempre tive de escrever pela voz do outro, não importasse o que estava sentindo por dentro
Imparcialidade, objetividade, escreva agora
O jornal tinha de sair no outro dia
Abria aspas e fulano disse que o “projeto vai ser votado hoje no Congresso”
Fecha aspas.
O blog surgiu pela vontade de quatro jornalistas de escreverem sobre vida, uma tentativa de, no nosso pequeno universo, humanizar um pouco as redes sociais
Poderia colocar essa mesma foto e manter o primeiro texto que escrevi, falando das bocas que já beijei, do samba que que já sambei, da carnavalesca que nunca morre em mim
Com paixão pura
Ninguém ia saber que a imagem do dia era falsa.
Uma amiga que comigo escreve esse blog se despede da filha antes de ela nascer e eu finjo que isso não me abalou
A carta da Fabrícia Hamu para Alice publicada ontem aqui abriu gavetas em mim que nem eu sabia que estavam trancadas
Mas vida que segue, vamos mudar de assunto
Afinal, é Carnaval, é alegria, é alto astral.
Poderia vestir a máscara perfeita pra esconder minha tristeza
Tenho várias na estante
“Quanto riso, oh quanta alegria, mais de mil palhaços no salão”
Mas me sinto a colombina estranha no meio da multidão.
Compaixão verdadeira
Não, não vou esconder minha tristeza
O que tinha escrito pra hoje perdeu o sentido pra mim, por completo
Tristeza não escolhe data.
Não, não quero me disfarçar porque esperam isso de mim
Não, não quero vestir uma fantasia só para dançar conforme a música
Me desculpem, mas vou desconstruir minha fantasia
Na quarta-feira, eu renasço nas cinzas.
*@tacianacollet é uma das fundadoras do Vida de Adulto, escreve às sextas-feiras, duas vezes por mês.
