Aguenta firme, suas raízes são fortes

Foto: Arquivo pessoal

*Taciana Collet

Eu moro há quase vinte anos no mesmo lugar e nunca tinha dado muito bola pra ela. Mas, nos últimos meses, venho abrindo a janela do apartamento com um outro olhar. Ou talvez meus olhos tenham ganhado uma nova janela. O fato é que a árvore que você vê na foto virou minha companheira diária. Faz parte do meu ritual abrir os olhos e a janela pra dar bom dia pra ela.

Arrisco dizer que cada dia minha árvore amiga está diferente.

Uma sutil diferença, que, com o passar dos meses, vira uma diferença gritante. Hoje mesmo, depois de uma das últimas chuvas do outono, ela era a exuberância e vitalidade em pessoa. Verde, verdinha, verdejante.

Oito meses atrás, no auge da seca em Brasília, o verde tinha sumido, a grama secado e pequenas flores roxas apareceram depois de ela ter ficado só com galhos secos. Foi aí que comecei a fotografar. Queria entender o ciclo de vida dessa minha robusta vizinha.

O legal foi observar que quanto mais eu olhava pra árvore, mais eu olhava pra mim. Me interessei verdadeiramente pelas transformações dela e a minha.

Nós nos escolhemos pra acompanhar as mudanças uma da outra.

Dois meses atrás, teve um vendaval de noite em Brasília e eu estava fora da cidade. Meu marido me ligou contando que uma árvore grande em frente à nossa janela não tinha resistido e caído inteira. Sabia que não tinha sido ela porque sei que suas raízes são fortes. E não foi.

Fico eu viajando, imaginando agora minha amiga árvore olhando pra mim nesta quarentena, talvez sem entender porque eu passo o dia na janela. Talvez sem entender porque meu olhar anda distante e diferente. O que diria? Que árvore eu seria? Já mudei tanto desde que nos conhecemos… Mas ela também vive mudando, talvez por isso me entenda. Porque tem dias que acordo ipê florido de amarelo e assim passo uma temporada.

Em outros, me sinto envergando com todo balanço do bambu. Tem época que sou a própria mangueira carregada de manga. Mas tem fases, como agora, que sinto que posso ser derrubada pelo vento na próxima chuva. Nesses dias, eu olho pra essa companheira verdejante em busca de respostas. Ela olha pra mim, olha pro lado e me diz:

— Aguenta firme, suas raízes são fortes.


*@tacianacollet é uma das fundadoras do Vida de Adulto, escreve às sextas-feiras, duas vezes por mês.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *