“O que você vai ser quando você crescer?”

Alexon Fernandes no Blog Vida de Adulto
Foto: Arquivo pessoal

*Alexon Fernandes

Com esta pergunta Renato Russo termina “Pais e filhos”, um blues que foi hit da Legião Urbana no final dos anos 1980. É também a música que me veio à mente no instante seguinte ao saber da morte de minha mãe, ocorrida há exatos 20 anos.

Morte repentina, com o gosto amargo de interrupção de sonhos e planos. Ela não viu um monte de coisas, seu instinto maternal não alcançou as netas, nem me viu cruzar as linhas de chegada nas corridas em que me meto. É a morte… E é a vida também.

A morte é perda, é corte. É necessário que se cuide e se cure.

A cicatriz que fica é a legenda de uma história. Mas temos que aprender a ler nossas próprias legendas. Depois de vinte anos, eu releio e reinterpreto minhas cicatrizes. E uma das perguntas nas minhas legendas é o que eu serei quando eu crescer.

Mas já sou homem feito, caminhando apressadamente para a meia-idade, e talvez esta pergunta não me caiba. No entanto, crescimento é um estado contínuo. A gente cresce para dentro quando para de crescer para fora. Paradoxalmente, ao crescer para dentro, a gente se expande, amplia os horizontes.

Nunca projetei ou supus uma vida em que minha mãe estivesse viva. Tanta coisa aconteceu depois, tantas coisas não saíram como o planejado e tantas surpresas lindas vieram. Hoje acordei com a sensação de que estou fechando um ciclo longo, de 20 anos, talvez. Neste ciclo, aprendi a entender meus pais, agradecê-los pelos acertos e perdoá-los pelos erros na odisseia da criação de seus filhos.

Agora sou pai e, fatalmente, sou exemplo, não tem escapatória.

Acerto e erro, sorrio e choro. Sou mais generoso comigo e não me condeno tanto pelos erros que cometi. “Pais e Filhos” tem uma admoestação: “Você culpa seus pais por tudo. Isso é um absurdo. São crianças como você. E o que você vai ser quando você crescer?” Continuo crescendo, caindo, levantando, rindo, chorando, acertando, errando. A vida se vive no gerúndio.

“Pais e Filhos” tem um alerta: “É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã.” Não deixemos pontas soltas. A chave para isso é a disponibilidade para (pedir e dar) o perdão, o quanto antes. No perdão e no amor crescemos.

Obrigado, mãe. Ah… Eu entendo as bolas fora. Não se pode acertar sempre. Você acertou muito. Estou aqui tentando não deixar de crescer. Vai dar certo.

(Dedico este texto às pessoas que amo como se não houvesse amanhã)


*@alexonfer é carioca, engenheiro, pai de uma adolescente, corredor amador, que não vive sem música, livros e um bom banho de mar. Autor dos textos do do @retratosescritos.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *