Eu me esvaziando de nós
Vou me percebendo encher bem devagar
até me preencher sem mais lugar pra ficar.
Sinto que vou afogar se deixo guardado.
O coração começa a bombear palavras desconexas por todo o corpo.
Elas querem se juntar, virar frase construída.
Só melhora quando deixo transbordar.
Aí permito que a vontade de escrever chegue aos dedos.
O teclado parece piano piando.
Inundo a página em branco.
Deixo o sentir interagir com o pensar e me ponho a dedilhar.
Meu agir não é movimento, se faz comigo parada,
sentada em frente a uma tela.
Não preciso de pincéis.
Tenho uma paleta de letras.
A S D F
Ç L K J
A datilografia, desde sempre, ajuda a me encontrar.
Eu não preciso de olhar para as teclas.
Meus dedos foram ganhando olhos despertos.
Eu sei a morada das letras de cor.
C O R
Meu pensar às vezes é mais rápido que minhas mãos.
Mas, às vezes, minhas mãos aguardam o meu pensar.
Há pausas silenciosas intercaladas por um conhecido som
que faz o pensar guardado deixar de ser só meu.
Não sei exatamente onde termino
e onde começa minha escrita.
Talvez não haja divisão entre nós.
Certamente ela não é só minha.
Só sei que quero estar ali no meio daquelas frases que surgem.
Já no terceiro parágrafo, começo a me acalmar.
No último, vem a plenitude do vazio.
Um esvaziar que me preenche.
Leio e releio tudo, reescrevo, troco palavras.
Devagarinho, burilo cada linha para me despedir desse trecho escrito de mim.
Escrever deixou de ser opção.
Sou eu me vestindo de palavras, eu me desnudando de verbos, eu me esvaziando de nós.
*@tacianacollet
Adorei isso, de não saber onde termina a escrita e começa a pessoa. Acho que não há divisão mesmo, escrever é uma extensão de nós
Vou me aproximando de vós. Amei