A dor da finitude

Foto: Arquivo pessoal

*Adrianne Vitorelli

Depois de oito meses de luta, a cirrose levou o fígado do meu pai a nocaute. Ele foi pra UTI e já estava apenas com cuidados paliativos, ou seja, indo aos poucos. Estávamos nos revezando nas visitas na UTI. No quarto dia na unidade, reunimos toda a família. Quando eu soube que ele não estava falando, cancelamos a entrada das netas de 16 a 20 anos. Apenas o neto mais velho, criado por ele, entrou.

Eu e minha irmã ficamos por último. Ela ficou muito emocionada, se despediu dele e saiu. Eu fiquei insistentemente repetindo para meu pai que no dia seguinte a gente iria para o quarto e ele não ficaria mais sozinho. Ele reclamava muito da solidão na UTI.

Eu falava: “Pai, me espera. Amanhã cedo estaremos aqui pra gente ficar no quarto. Tá bom, pai?” Insisti muito e ele com muito esforço disse “tá bom”. Foi um alívio. Mostrei fotos da minha filha, ele chorou. Dei um selinho nele, passei a mão nos seus cabelos finos, abracei e me despedi. Nem briguei com a enfermeira para ficar mais tempo na visita.

Mas o telefone tocou às cinco da manhã. Eu já sabia. Com o coração estrangulado, sem chão, devastada, como se naquele dia o sol tivesse morrido.

Fiquei mais de dois anos perguntando por que meu pai não me esperou. Ele prometeu… Durante esse período, eu fui tomada por muita dor, depressão, síndrome do pânico, surtos de desespero e saudade.

Um dia decidi participar de uma reunião em um grupo de apoio ao luto. Lá conseguiram me mostrar um outro lado dessa passagem, com menos sofrimento. Meu pai se foi naquele dia porque tinha certeza de que nós sempre estaríamos com ele, fisicamente ou não. Então ele ficou sereno e se foi.

O que eu quero dizer com essa historia é que a finitude dói e a gente enlouquece, que precisamos amar nossa família e amigos. Demonstrar efetivamente esse afeto e, por fim, que para sobrevivermos a momentos tão difíceis, podemos buscar ajuda e aliviar nosso coração, Desculpe, pai! Hoje eu respiro e honro o senhor. O amor só aumenta, assim como a saudade.

*Adrianne Vitorelli é uma jornalista que busca autoconhecimento, contar histórias e acima de tudo entender qual é a missão nesse mundo de meu Deus.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *