Intensivão de vida
*Daniela Saldanha
Minha vida toda, esperei um grande acontecimento, desses que as pessoas intensas pensam em viver. Em abril de 2019, notei algo estranho em mim, um carocinho na mama direita. Conhecer meu próprio corpo fez toda diferença ao enfrentar a doença que eu descobriria dali a alguns dias: câncer de mama.
O choque inicial não existiu. O modo como minha médica conduziu as consultas, fez com que a informação fosse sendo passada de forma gradual e, quando saiu o resultado da biópsia, eu estava preparada. A parte mais difícil no início foi contar para as pessoas amadas e lidar com o sofrimento delas.
Já passei pela fase mais crítica do tratamento, pelo corpo debilitado, agredido pela quimioterapia: fadiga, náusea, mal-estar, pele ressecada, frágil e com lesões; unhas manchadas, queda de pelos e cabelos, cílios e sobrancelhas; inchaço por causa dos corticoides.
Diariamente, ainda encaro questões dificílimas relacionadas ao câncer. A possibilidade da morte muito mais perto, mesmo sabendo que isso fatalmente vai acontecer um dia; rever as prioridades da vida, perceber que sempre fiz tudo errado e, talvez, continue fazendo; questionar minhas relações com as pessoas, o valor que tenho dado a elas e entender que ninguém é autossuficiente; tomar consciência de que não tenho controle sobre nada (e nunca tive); enfrentar inseguranças ligadas à feminilidade, à sexualidade; aceitar que nunca mais serei a mesma pessoa.
Mas, por mais estranho que pareça, ainda que meu grande acontecimento seja trágico, ele tem um lado bom. É incrível o apoio dos amigos, familiares e pessoas ao meu redor, o amor que vem de todos os lados. O que estou passando é muito difícil, a ideia não é romantizar o câncer. Mas aprendi muito nesse “intensivão”, fiquei forte e passei a enxergar a vida de um jeito melhor. É maravilhoso perceber minha capacidade de adaptação e como para tudo tem um jeito. E, se não tem, o tempo ajeita.
*Sou a Dani @dandansal. Crocheteira e curiosa, tenho 44 anos, 4 gatos e 2 bikes.