O dia em que fiz o exame de Coronavírus

Foto de Jairo Lopes usando máscara verde
Foto: Arquivo pessoal

*Jairo Lopes
 
Em minha mesa há um trecho da bíblia, destacado pela minha mãe, que diz para eu ser forte e corajoso. Dona Joana pediu que eu lembrasse disso quando os dias fossem difíceis ou quando eu não soubesse bem o que fazer.

Aprendi que conselho de mãe é sempre para valer. E aquela velha folha por vezes deu a coragem para enfrentar a vida. E por vezes me ajudou a enfrentá-la com medo mesmo.

Então em um dia qualquer de trabalho, nos corredores da firma, alguém disse: “Você deveria testar, já que não pôde fazer o isolamento. Aproveite que estamos realizando o exame.”

Estive no exterior e isso, aliado ao trabalho, poderia fazer, sim, com que alguma coisa desse errado. Entrei na sala e colocaram um grande cotonete no meu nariz e no fundo da garganta. Terminado o procedimento, além de uma vontade de espirrar, senti-me sozinho e pensativo: alguns disseram que era só uma gripe. Outros disseram que na minha idade a letalidade era baixa.

Mas se a coisa não era séria por que proibiram os abraços? Os beijos? Os cafés? Quando nos tiram isso não pode ser algo à toa. Comecei a ver jovens morrendo. Atletas morrendo. Definitivamente a vida se fazia frágil de um modo que eu, homem feito, nunca havia me dado conta.

Senti medo. E, talvez pela fadiga emocional causada por tantas notícias ruins, um medo de dimensão desconhecida.

E junto com ele veio o velho clichê de deixar para trás, sem ter dito um “eu te amo”, a todos que eu sabia se importarem comigo e o pior: e se eu partisse sem poder tentar reerguer quem já está tão machucado por causa desses dias de incerteza?

Mas então sentei à mesa e lá estava: “Seja forte e corajoso.”  Respirei! Eu precisava lembrar da coragem de que falava a minha mãe; só assim o medo não me impediria de compreender o propósito de tudo isso.
Percebi enfim que a vida muda o rumo sem aviso. Eu compreendi a sua finitude e, principalmente, a impermanência das coisas.

O resultado foi negativo. Graças a Deus. Mas daquele dia em diante tive a certeza da minha insignificância. E quando se ganha essa certeza de presente, nascemos de novo. Nascemos melhores.


*Jairo Lopes é um cara que adora histórias de amor e torce por finais felizes. Ama fotografia, cachorros, todos os cachorros, pôr do sol, música, doce de padaria, estrada, cozinha e, no restante do tempo, trabalha e vive as alegrias e dilemas da vida real.

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