O filho e o pai

Enio Vieira faz homenagem ao Dia dos Pais com o texto O Filho e o pai
Foto: Arquivo pessoal

*Enio Vieira

Em tempos de olimpíadas, é bom lembrar que derrotas ensinam tanto quanto vitórias. No no final de 1981, teve uma partida do campeonato de futebol de salão – o nome do futsal na época. Um “mundial” para crianças de 11 anos, numa cidade do interior de São Paulo.

Os jogos daquele torneio ocorriam à noite. O pai com 38 anos havia perdido a grande semifinal, quando o filho foi obrigado a se tornar goleiro e garantiu a vitória do time. Com todo exagero, sentiu-se na pele do alemão Maier ou do argentino Fillol.

A partida final prometia grande emoção. Os colegas logo escalaram o filho na posição de goleiro. O olhar dele estava na pequena arquibancada no fundo da quadra. O pai ainda não havia aparecido, e o jogo estava por começar.

No meio do primeiro tempo, o pai apareceu com roupa de trabalho, paletó nos braços. Ficou de pé na arquibancada, observando de lá imóvel.

Dois gols no início da partida complicaram a situação para o time do filho.

Os companheiros decidiram que o “guarda-metas” iria para a “linha” no segundo tempo. Faltava potência de ataque. Começou a jornada épica. A presença do pai dava segurança e peso da responsabilidade sobre o filho.
O time do filho conseguiu um gol. A partida entrou na fase dramática, como só o futebol pode ter. Veio a tragédia, quando o empate parecia próximo: a equipe adversária fez um gol sobrenatural. Placar: 3 a 1, com um minuto para terminar. A derrota inevitável.

Terminou o jogo, uns colegas chorando, e o filho apenas caminhou em direção ao pai – que, pensou, estaria decepcionado. Caminharam juntos em direção à saída: o filho de cabeça baixa, e o pai o conduzia com a mão no ombro.

“Muito bom o giro que você deu naquele menino, e o seu passe para o gol de vocês também. Ah, faltou pouco para aquele chute seu entrar no finalzinho do jogo. Importante jogar bem, caprichar nas jogadas”, disse o pai que entendia muito de futebol de salão.

Nada de broncas ou cobranças implacáveis. Apenas acolhimento e orgulho. Penso que, lá em 1981, o pai formulou para o filho uma “ética da derrota”, alta da sabedoria, na linha de um personagem de Guimarães Rosa.


*@enioalvesvieira, jornalista, espera escrever o livro que planeja desde sempre.

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