Amar se aprende amando
“Tchau, minha gotinha mágica”. Na Rodoviária de Brasília, a despedida da avó veio seguida do beijo na testa de uma garotinha. Ao entrar no ônibus, vi que a senhora se sentaria ao meu lado. Começamos a conversar e descobri que era Josefa, uma aposentada de 63 anos. Perguntei por que ela chamava a neta de “gotinha mágica”. “É uma longa história”, respondeu.
Josefa veio do sertão do Piauí para Brasília com 16 anos, fugindo da miséria. Perdeu os pais ainda criança e os dois irmãos “sumiram no mundo”. Trabalhou como doméstica e, aos 20 anos, casou-se com o primeiro namorado. Teve três filhos e sustentou a família com grande dificuldade. “Era empregada durante o dia e costureira à noite”, lembrou.
Passou a vida ouvindo dos filhos que “era muito seca, porque não sabia fazer carinho”. É que, como boa sobrevivente da seca nordestina que era, estava mais preocupada em garantir comida, escola e saúde. Até que Clara nasceu. “Ela chegava e me cobria de beijo e abraço. Era carinhosa sem esperar nada de mim”, disse.
Um dia, Clara sugeriu à mãe e à avó que fizessem um “sanduíche de amor”. Josefa quis saber o que era aquilo e a neta explicou: “Eu fico no meio, enquanto você e mamãe me abraçam”. Ao atender o pedido da menina, foi obrigada a dar por tabela o primeiro abraço da vida na filha e a olhar nos olhos dela. “Fiquei congelada, sem reação”, confessou.
Dias depois, foi Josefa quem pediu o “sanduíche de amor”. “Dessa vez, abracei minha filha bem forte, e nós duas choramos”, falou. Meses mais tarde, veio o pedido da filha: “Mãe, se você me ama, diz isso, por favor”. De novo, Josefa congelou. Até que, no dia seguinte, mandou uma mensagem de voz falando que a amava muito. Mais choro e gratidão.
“Clara é minha gotinha mágica, porque é o remédio que me curou da falta de amor”, explicou. Josefa estava vindo à Goiânia visitar o neto que nascera. “Antes, eu fingia que nem ligava. Hoje, faço questão de vir e mimar muito”, contou aos risos. Um beijo aqui, um abraço ali, e quando a gente vê, já está exercitando o afeto. Como dizia Drummond: “Amar se aprende amando”.