Eu fui “Mar Morto”


Foto: Arquivo pessoal

*Géslei De Jesus

Interessante como um fenômeno da natureza pode espelhar nossas emoções e comportamentos. Parece clichê, né? Eu tenho essa forma de ver algumas coisas, como paralelos e parábolas. E foi assim que me senti para externar esse momento.

O Mar Morto, um lago situado no Vale do rio Jordão, possui características singulares e incomparáveis. Ele é alimentado apenas pelo Jordão, e não tem afluente, retendo todos os minerais, e, devido ao excesso deles, extingue toda vida que recebe. Por isso, suas águas são tão densas e salgadas que não há vida, daí o nome Morto.

Aqui, faço uma reflexão. Inclino-me sobre minha essência. Ao sondar a alma, me encontro Mar Morto. Talvez seja uma expressão forte demais para compreender a vida e seus momentos, porém, devido ao contexto, é necessário que se faça.

Como o rio Jordão que escorre caudalosamente por sua via, trazendo não somente vida, mas também o agravo. Eu recebi de um “rio” muita vida e, também, agravos. Então fui acumulando tudo aquilo que aparentemente seria dádiva, tornando-me eficaz e solidário, pois me acostumara a receber males e usá-los positivamente.

Eu, Mar Morto, era tão eficiente e útil, tão natural e único, que me sentia bem. Com o passar do tempo, percebi que todo esse fenômeno, tudo que vivi me tornou quem sou. Em contrapartida, vieram as frustrações. E como é difícil sentir o coração apertar, com gritos sufocantes e uma alma rasgada por dores e arrependimentos. É duro perceber que você pode ser tão amigo, tão conselheiro e, ao mesmo tempo, cheio de vazios.

E para que tanta obscuridade fantasiada de afeto e inteligência? Para que serve a experiência incontestável se a existência for sem propósito?

Pensei comigo:
“Eu que não sou mar! Sou apenas um lago, com sua expiração breve.” Iludi-me quando acreditei que era autossuficiente, porém estava morto. Morto no sentimento, na razão e evaporando na aridez da presunção.

A vida nos propõe a mudança de sabores, tons e propósitos. Morto é quem vê sua resiliência passar diante de si e não a abraça com incondicional afeição. Nunca é tarde demais para ser um Jordão, nunca é tarde para ser Vida.

*Géslei S. De Jesus, nascido em Feira de Santana (Bahia). As boas línguas dizem que: “Baiano não nasce, estréia.” Moro em Brasília, desde Janeiro de 1986 e, de lá para cá coleciono momentos bons e ruins. Aprendi com os ruins e temperei com os bons.

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