Macho em descontrução

Foto: Pixabay

*Ednardo Viana

Estive pensando sobre feminismo e machismo. Sem jamais ignorar toda a pressão e força bruta exercida sobre as mulheres, é preciso pensar além. A sociedade precisa se reconstruir. Longe das diferenças de gênero, quantos detalhes tão sutis são negados aos homens? Quantos “somos” amputados de sentimentos?

Um exemplo rápido. Lembro da Copa de 1994 nos Estados Unidos. O Brasil venceu os donos da casa, no dia da independência deles. Bebeto cravou o 1 a 0 num lance genial de Romário. Saiu para comemorar, abraçou o Baixinho e todos puderam ler pelos seus lábios um: EU TE AMO! Nunca esqueci do que ouvi de um homem: “Esse Bebeto é “viado”!”

Tinha 14 anos na época. Fiquei martelando: “Mas ele é casado. Fez um gol para o filho depois e o embalou numa comemoração linda.” Não tinha a maturidade para enfrentar: “E daí, se for?” São essas coisas que nos são passadas subliminarmente ao longo da vida.

Os caras da minha geração jamais poderiam chegar perto de uma boneca ou vestir rosa. Meu pai era de uma geração em que poucos homens trocavam fraldas. Meu avô era de uma época que não se beijava os “filhos homens”. Falo de menos de cem anos.

Me alento nas transformações e até nos beijos que ganhei do meu vozinho já velho e nos inúmeros afagos que recebi do meu pai e de tudo que tive e tenho que reconstruir para educar meus filhos: três garotos.

Me recordo de quantos choros segurei, mesmo que, em casa, tivesse o direito de verter essas lágrimas. Devo ter ouvido que “macho” não chora. Homens são treinados para a posse: de bens e sentimentos. Como se a vida fosse uma grande fazenda que a gente joga para dentro o que conquista, fecha a porteira e cultiva.

Somos criados para ser leões que exterminam o que não é a própria prole. E, assim, jogamos para dentro o que deveria fluir. Às vezes, lacramos o “ruim” dentro de uma caixa e enterramos dentro de nós. Uns renascem, se reinventam, incineram esse lixo em consultórios, igrejas ou, até sozinhos, em silêncio. Outros, muito pior, matam, morrem, mutilam, aprisionam ou são aprisionados na alma, no coração, no calabouço.

Acredite, não é fácil ser um macho em desconstrução.

*Ednardo Viana é o segundo de quatro filhos, pai de três meninos, jornalista, bem casado, apaixonado por futebol, samba, conversa, natureza e gente.

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