Se a vida te der saudade, faça arte
Saudade do quê? Saudade de mato, de andar livre pelos caminhos. Saudade do calor das pessoas, já me deu uma saudade do abraço, de respirar o ar que é nosso, de respirar junto, sabe? Eu, você, eles e nós. Já me deu uma saudade, saudade essa que eu não supunha antes: saudade do trivial, saudade de dizer: “Vamos tomar um café qualquer dia desses, estou com saudades.”
Então é isso, pronto falei. Estou com saudades do café que não tomamos — porque certamente estávamos ocupados demais vivendo nosso script, nossos passos tão bem coreografados, nossos segundos cronometrados. “Ai, se você atrasa cinco minutos, ai de você.” Pois é, agora eu bem que toleraria o seu atraso, afinal qualquer atraso poderia ser melhor do que ficar presa (ou segura) em casa. Já me deu uma saudade que eu teria de casa se estivesse longe — só que ao contrário, de cabeça para baixo.
Saudade do longe. Tempo para o perto, do perto que eu estava distante.
“Que bom, agora posso me aproximar… melhorar com as raízes do meu mato.” Saudade do mato e daquele cheiro de verde. Saudade amenizada quando o mato mora dentro da gente. No fim das contas, sou filósofa de marquise e “só sei que nada sei” não é para mim. Porque só sei o que sinto (e sinto que sei as saudades).
E por essa saudade excessiva que eu sinto, durante a quarentena, passaram-me até receita para curá-la. A receita é mais ou menos assim: Muito mais que caipirinha ou limonada, combine cores e amores. Se a vida te der limões (ou saudades), dê uma gargalhada e diga que o cinismo desse tal coronavírus mexeu com a pessoa errada.
Se a vida te der limões, aproveite a vitamina C — na falta da vitamina sea.
Na falta de mar, mentalize um mergulho e sinta o gosto do sal. Sinta o arder dos olhos, assim como o ardido do limão: azedo. No excesso de acidez, ponha açúcar.
Estamos todos em casa vivendo o verdadeiro significado das coisas simples, não-prontas, espremidas que nem esses “limões-saudades” que a vida te deu. Estamos na cozinha, no banheiro e na sala de ser (e estar). Estamos fazendo nossa arte com a parte que nos cabe da saudade. Depois dessa, o afeto aqui será mato… (e aquele café vingará!)
*@carol_gaert tem uma parte doida e outra santa. Sofre de expressão Alta e tem comichão na mão que a faz escrever nas horas vagas e não vagas. Nascida na terra de Leminski e Ruiz. Curitibana da nata, guria do leite quente. / Instagram: @criativaescrita