Tempo de silêncio e solidão
Minha casa anda mais quieta. Eu, que sou feita de música, agora tenho que me preocupar com o volume da caixa de som. “Agnes, cuidado com os vizinhos! Eles não são obrigados.” “Mãe, abaixa esse som!” “Podemos ficar em silêncio um pouco?”
Logo eu que tenho medo do silêncio e da escuridão. Se antes eu preparava o almoço ouvindo uma lista de canções que julgava as melhores, em alto volume, muitas vezes dançando, hoje preciso me policiar.
Se um dia meus filhos pularam comigo no sofá cantando “É cedo ou tarde demais, pra dizer adeus, pra dizer jamais”, hoje ele preferem a discrição. O momento em que descobri que já não agradava mais foi em plena pandemia pelo coronavírus. Foi quando tivemos que ficar ainda mais próximos, 24 horas por dia. Foi quando percebi que era preciso recuar.
Na minha cabeça, estava deixando minha casa alegre e festiva, mas na verdade ninguém aguentava mais aquelas músicas dos anos 80, nem as imitações do Elvis, do Morrissey ou da Cindy Lauper.
Da mesma forma, minha mania de limpar os quartos, antes de ser um sinal de cuidado, era apenas mais uma fonte de irritação. “Mãe, deixa que eu arrumo”. “Mãe, não entra no meu quarto!”. “Não guarda as minhas coisas, porque depois você não sabe onde tá!”
E é nesse momento que a gente começa a se recolher. E cada dia sua voz se cala um pouco. Isso, em absoluto, quer dizer que o amor e admiração diminuíram, quer dizer apenas que é preciso abrir espaço para novas referências, novo paradigmas.
Cada um tem sua playlist preferida, cada um tem seu jeito de organizar o quarto. Mas é que ontem eles tinham 8 e agora têm 28 e eu nem percebi. É meu tempo de calar, de ficar só e traçar novas metas. Acho que vou, enfim, voltar a ler com a frequência dos meus 20 anos.
Tem uma pontinha de tristeza? Tem. Tem uma sensação de que você não é mais tão necessária? Tem. Mas também é um tempo para me ressignificar. Nesse tempo de silêncio e solidão espero renascer. É com a maturidade que vem a calmaria?
*@agnesssmelo, jornalista, alma livre, 53 anos.