Estar perto não é físico

Foto: Depositphotos

*Fabrícia Hamu
⠀⠀
“Deixei uma lembrancinha pra você na portaria. Se cuida!”. O barulho da mensagem no celular vem acompanhado do som do interfone. O porteiro me pede para buscar o pacote de tomates orgânicos. Ele agora se soma aos limões, maços de erva cidreira, alecrim, máscaras de pano, pedaços de bolo e palhas italianas que também me foram dados nas últimas semanas, de forma carinhosa e inesperada.

Nessa quarentena, descobri que há quem se lembre de mim entre caixas lotadas de uma mudança. Entre crianças e adolescentes que correm e gritam exigindo atenção. Entre relatórios que aguardam finalização. Que precisa me ver pelo FaceTime. Que passa perrengues sozinho porque não quer me incomodar no meio de uma crise de fibromialgia. Que adia a cobrança de uma dívida porque sabe que agora não posso pagar.

Quando tudo isso começou, tive medo da solidão

Perdi minha mãe há pouco tempo, moro sozinha e não sabia se suportaria ficar dias a fio dentro de casa. Mas, quase de hora em hora, sou abraçada pelo carinho que chega por mensagens ou chamadas, querendo saber verdadeiramente como estou; rindo ou chorando junto; partilhando e curando. O carinho de quem faz até campanha de oração para que meu coração fique em paz.

A verdade é que estar perto não é físico. A sensação de acolhimento vem do afeto, e gostar não é estar ao lado. É se importar. É se doer com o sofrimento do outro. Se ensurdecer com seu silêncio. Se incomodar com sua ausência. É aceitá-lo com amorosidade e sem julgamentos. É mostrar que não temos de ser produtivos, transcender em espiritualidade, ficar sarados ou aprender coisas novas na quarentena. Está tudo bem em ficar vulnerável e precisar de colo.

Este é um texto de agradecimento. Obrigada a todos que se fazem tão presentes. Que me ajudam a ter fé e esperança que tudo isso vai passar. Que me lembram que a hora de demonstrar que você se importa é agora, porque o amanhã é incerto e por isso o hoje tem de valer a pena. Que me ensinam que, dentre tantas lições deixadas pelo coronavírus, a mais valiosa delas é a urgência de amar.


*@fabriciahamu é uma das fundadoras do Vida de Adulto. Escreve às segundas-feiras, duas vezes por mês.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *