Feminista por obrigação

Roseli, mãe de Carla Caroline (Foto: Arquivo pessoal)

*Carla Caroline

Uma mulher, três filhos, início da década de 1990 e uma separação. Uma cidade do interior de São Paulo, alcoolismo, uma família numerosa e muito trabalho.

Foi em meio a tudo isso, no alto dos meus seis anos, que aprendi a primeira lição de vida: tenha uma renda para se manter independentemente de apoio masculino.

E, assim, descobri o feminismo. O feminismo negro que, naquela época, não possuía um – ao menos para mim. Naqueles anos, era apenas uma mulher que, aos 26 anos, optou por romper barreiras e seguir o coração. A sua fé, como definiria ela. Ela, no caso, minha mãe.

Ela, que agora em outubro faz 53 anos, trouxe e traz para minha vida os reais princípios de perseverança e resiliência. Ela que mostrou a mim e aos meus irmãos que poderíamos ser tudo o que quiséssemos, mesmo que ela não pudesse.

Roseli nunca morou fora de Ourinhos, era brava e quando alguém reclamava dos filhos dela, a resposta vinha em forma de surras. Sim, apanhamos muito. Hoje compreendo os motivos. Ela saía de casa muito cedo, voltava muito tarde e ainda precisava ouvir as reclamações – ou fofocas mesmo – sobre as crias. A “correção” vinha da cinta.

Foi ela quem me ensinou a lutar pelos meus sonhos, mesmo deixando os dela de lado. Afinal, era preciso nos alimentar e educar. Diante de todas dificuldades, conseguiu. Os três estão vivos, contrariando as estatísticas relacionadas aos jovens negros, periféricos e criados sem a presença masculina no Brasil.

A Rô, tia Rô, Roseli, mulher, mãe e profissional, é a melhor avó do mundo. Toda atenção que a vida não permitiu que ela desse aos filhos é dedicada aos netos. Tem risada solta, “eu te amo” diário e remédio na boca.

Descobri a palavra FEMINISMO aos 24 anos quando cheguei a São Paulo. No entanto, o significado da palavra me foi dado em 1987, quando minha mãe escolheu me permitir nascer.

Olhar para minha mãe é reconhecer a necessidade da luta constante por igualdade de gênero e raça. É perceber que um pai faz falta, mas que uma mulher incrível pode mostrar os melhores caminhos e criar uma feminista por necessidade e obrigação.


*@carlacaroline25 é colaboradora fixa do Vida de Adulto. Escreve aos domingos, a cada 15 dias.

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